domingo, fevereiro 07, 2010

The Wire

Caros Comparsas, é com muita alegria que o Falcão volta aos voos no ano de 2010 com uma série que muito me agrada e surpreendeu. E o motivo desse regozijo é The Wire. E se vocês se interrogarem qual o porquê deste entusiasmo, eu respondo que é porque The Wire é uma série diferente, para melhor, mais complexa e completa do que qualquer série policial que já tenham visto na vossa vida. E se vocês perguntarem o porquê de ser assim tão bom e ninguém conhecer, eu respondo que é capaz de ser porque não é fácil ficar viciado em The Wire, porque antes disso não é fácil gostar de The Wire. É das séries televisivas que mais investimento pede ao espectador devido ao que exige de paciência, atenção e dedicação.
Basicamente, The Wire é sobre uma equipa de investigação especial da polícia de Baltimore, formada pelo detective de Homicídios Jimmy McNulty, o tenente dos Narcóticos Cedric Daniels e os seus subordinados Herc, Carv e Kima, o sábio Lester Freamon e o "só aparentemente" incapaz Roland Prezibilewski. Na primeira temporada, investigam os negócios de uma organização de tráfico de droga comandada por Avon Barksdale e seu braço-direito (e uma das personagens mais geniais que a televisão já viu, um traficante que se inscreve num curso de gestão para melhor conduzir o "negócio") Stringer Bell. Mas The Wire não é uma série policial normal e ao contrário de CSI e seus sucedâneos muito semelhantes, um caso não dura apenas um episódio, mas um temporada inteira. Ainda para mais, a série não se limita ao trabalho policial, nem aos meandros da organização de Barksdale, mas aos pormenores mais ínfimos da realidade das ruas de Baltimore, desviando-se para as vidas de personagens como "Bodie", "Poot" e Wallace, jovens membros da "empresa" de Barksdale, ou o informador de Kima e toxicodependente "Bubbles", ou o genial Omar.
The Wire é o programa de televisão favorito de Barack Obama e mais um monumento da HBO e há quem a considere a melhor série televisiva americana de sempre. É uma série que pede mais paciência e dedicação ao espectador do que outras produções: arde em fogo lento, move-se sem pressas e uma das ousadias de The Wire é, por exemplo, abrir com um episódio-piloto que apresenta personagens e pouco mais faz para cativar o espectador. Há polícias e criminosos, há áreas cinzentas com fartura de um lado e do outro, há incompetência profissional como raras vezes uma série policial mostrou, não há tiros, perseguições, resoluções. Pelo contrário: há moleza, frustração, confusão, enganos, progressões que não o são, regressos à estaca zero. The Wire conquista-nos precisamente pelo seu ritmo lento, pelo tempo que nos obriga a passar com todas aquelas personagens - polícias, criminosos, políticos - e pelo bem que ficamos a conhecê-las por causa disso. E conquista-nos porque é próxima de nós - não há heróis invencíveis, não há Gil Grissoms nem Jack Bauers, há pessoas que se atrapalham, que erram, há facínoras que vingam e gente boa que se vai abaixo. Como é que se consegue tornar tão interessante e viciante uma série policial que troca o glamour habitual pelo retrato realista, feio, porco e mau de uma investigação na vida real? É aqui que reside a prova do brilhantismo de The Wire, série que se estranha e que se vai entranhando a cada minuto.
No primeiro vídeo que aqui vos deixo podem ver um momento sublime que ficou célebre pela fusão impressionante entre realização, montagem, trabalho dos actores e o texto do guião. Que, durante alguns minutos, consiste simplesmente na palavra "fuck" e suas variantes. E assim se diz tanto com quase nada. E assim se fica cliente de The Wire!


Saudações de um Comparsa